Samba-em-Sampa-de-Criolo-Doido

20:45 Raquel 0 Comments



Levei as mão a cabeça por um desespero lânguido da repentina perda de sono. Como se já não bastasse, ficarei a noite inteira com essas notas reverberando em meus ouvidos.

E é assim que começo uma singela resenha do disco que escuto em looping nesse momento. "Nó na Orelha" do Criolo (Clica no link, vai. Lá tem link pro download do álbum).

A primeira vez que ouvi uma música do Criolo foi dia 29 de maio. Entrei em um site que, em sua playlist, tinha "Subirusdoistiozin"e fiquei impressionada com a forma como ele se utilizava das palavras, como um Adoniran Barbosa do séc. 21, o Adoniran do Grajaú. Pensei "o cara é bom...".

Hoje resolvi procurar o álbum inteiro e me impressionei mais ainda. Muito, muito mais. A cena que descrevo no começo desse post é exatamente minha reação ao ouvir "Não existe amor em SP". Quem é esse cara, meu? Quem é ele para me deixar 'de cara' desse jeito? Pois é. Que sonoridade é aquela? 
"Não existe amor em SP Os bares estão cheios de almas tão vaziasA ganância vibra, a vaidade excita"
E o que ele diz, usando a resposta crua e a única cabível a verdade que poucos trazem.

Hoje um paradigma foi quebrado. Minha cabeça ainda roda como em uma máquina de lavar, meu radar sensível a um mundo que me recusava a mergulhar. O rap brasileiro, cantado no português de nomes constuídos a partir do concreto frio de sampaulo. Criolo, Emicida é outro que estou aprendendo a escutar. Ainda me faltam caminhos longos para conhecer, mas agora sei que é um caminho válido a acompanhar.

O que me deixa mais intrigada é que faz 20 anos que o Criolo faz música. 20 anos é quase o quanto eu tenho de vida. Ele faz isso por uma vida e só agora caiu na graça dos hypados.

Daniel Granjaman, do Instituto e Marcelo Cabral são os responsáveis pela produção do disco. Óbvio, os caras são bons. Metais, batidas pulsantes e affrobeat complementam e enchem as letras de Criolo com perfeição. Mas se 90% do talento que o Criolo faltasse, esse disco não seria nem 2% do que é. Estatísticas e probabilidades a parte, o " Nó na Orelha" é pra dar nó na orelha, na garganta e no cérebro. Pra quem não tem o custume de ouvir rap, como eu, é de dar nó na vida. Virar de cabeça pra baixo. É só abrir os olhos, os ouvidos e derrubar todas as paredes que te impedem de entender coisas que fogem da bolha em que você vive. Deixe que a bolha se desfaça. Deixe que as batidas, que vão do rap "tradicional" a balada brega, passando pelo samba e pela mpb, invadam e preencham os espaços deixados pelo pré-conceito e pela aversão ao novo. Ouça o bom uso de metais, pandeiros e scratchs. Ouça os lamentos, as brincadeiras e as histórias de realidade e opinião forte.

Ora Adoniran, ora Bezerra da Silva. Ele passa por Reginaldo Rossi e permeia entre os mais diversos tipos de rap. Ele rima, não rima. Conta, incrimina, canta e ri da desgraça. Mas principalmente ele expõe de tudo um pouco do que conhece.

Minhas favoritas? Todas. Mas se tiver que citar: Subirusdoistiozin, Mariô, Linha de Frente e Não existe amor em SP.

E o que somos nós, além a mistura infinita de ritmos e preces constantes? E o que somos nós, se não o encontro de todos esses instrumentos da afeição musical? Aos que temem por esse momento, lhes digo, com toda certeza, somos o retrato de "Nó na Orelha". Ou que seja, o álbum genial de Criolo, o retrato cuspido e escarrado de nossa realidade como massa de uma cidade confusa, como é São Paulo.

Fiquem com "Não Existe Amor em SP":

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